outubro 20, 2003

PROPOSTAS PARA O FUTURO? (1)

Qual barata tonta, o país tenta percorrer desde há muito os caminhos desse negrume insondável que é o futuro. Tem uma vaga ideia do que quer, não sabe por onde ir, nem porquê chegar.

Nos primeiros tempos da Ditadura Nacional, havia um projecto: "mais Portugal". Curiosamente, isso traduzia-se em menos Portugal: menos indústria, menos cultura, menos alfabetização, menos liberdade. Em contrapartida, o ênfase era dado a mais religião, mais família, mais autoridade. Pelo menos, sabia-se o que se queria. Ainda que não se soubesse onde se queria chegar. Como se o fim fosse o caminho e não a chegada: o futuro, a manutenção do status quo. Até à guerra, o entusiasmo que a juventude dos dirigentes permitia, ainda possibilitou a excelência de um Duarte Pacheco (não há niguém que se entretenha a editar um blog dedicado à santíssima trindade - Marquês de Pombal, Fontes Pereira de Melo, Duarte Pacheco?), o frenesim de um António Ferro, as encomendas ao Mestre Almada. Depois, o reumatismo de todos, carunchou tudo e, até 74, o país cabia todo num documentário cinzentão comentado por monótona voz-off. Infelizmente, o entusiasmo não durou muito. Nestes tempos mediáticos, em technicolor, temos mais do de sempre: à pergunta "quem és, de onde vens, para onde vais" não será descabido ouvir responder "daaahhh! sou o tuga, não vou à escola, e não sei para onde vou, mesmo que dispares a pistola".

Portugal tem viabilidade como país industrial? De subsistência. Tem viabilidade como país da chamada 3ª vaga de industrialização, à maneira da Irlanda? Com as coisas como estão... implica destinar pelo menos 3 ou 4 vezes mais verbas para os Ministérios da Educação, Ensino Superior, Ciência e tecnologia, implica mudar radicalmente as leis e as mentalidades no que respeita ao trabalho, à criação de novas empresas, aos impostos. Existirá a coragem para diminuir na proporção os orçamentos de ministérios tão sensíveis como os da Saúde, Segurança Social, Defesa?

Provavelmente - e é para aí que eu me inclino -, Portugal só terá viabilidade se apostar na diferença. Ou seja, ir por um caminho que seja o primeiro (ou dos primeiros) a desbravar, em vez de correr por onde os outros já passaram. E é seguindo essa ideia que defendo a escolha de Portugal como destino de turismo cultural, definindo esta cultura como a soma de três componentes: cultura histórica (arquitectura, arte medieval e renascentista), cultura (à falta de melhor termo) socilógica (as gentes, a gastronomia, o artesanato) e cultura ecológica (os espaços, a especificidade dos vários territórios).

Já lá vão os tempos da "sunny beaches"! Não sendo diferente da oferta dos outros locais turísticos, resume o número de visitantes a uma batalha de preços, com consequências nefastas na economia e no ambiente (vejam-se as aberrações do Algarve, veja-se o que se prepara para a costa vicentina).

Não sendo eu propriamente a primeira pessoa a falar disto, fazendo algumas destas ideias parte dos vários discursos oficiais que temos tido, o que se verifica é que elas não têm tido aplicação prática, sinal óbvio de que o discurso não está interiorizado. O que significa que esta não é uma prioridade para ninguém.

Prioridade será, equilibrar as contas no presente, para algum distraído as desiquilibrar num futuro próximo, quando a prioridade fôr, novamente, panem et circenses...

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