Bom bate-bola que se avizinha a propósito (ainda e durante muito mais tempo) do Iraque, com começos auspiciosos entre o Terras do Nunca e o "Mar Salgado".
Sabes como sou. Sinto uma comichão muito grande quando me dizem o que devo fazer. Os missionários sempre me causaram muita impressão, tanta boa vontade muitas vezes tão mal aproveitada (não, não estou a falar das campanhas de alfabetização ou de saneamento ou de higiene, estou a falar da introdução da noção de pecado, de culpa, do "mal" em sociedades estáveis que não precisavam desses conceitos para nada, estou a falar de um olhar intuso que, munido do facho da verdade se sobrepõe ao nosso olhar, em nome de uma auto-denominada supremacia moral). Recomendo-te "A Chuva" do Somerset Maugham (com uma chapelada ao Luís Varela Pinto) para me tentar explicar melhor.
Há que levar as coisas com um certo distanciamento para não tomarmos posições demasiadamente influenciadas pela emoção do momento, sem grande apoio factual. A minha costela imprecisa de historiador. É engraçado, ainda há quem acredite na bondade das nações. No caso vertente, na justificação de que os Estados Unidos invadiram o Iraque para lhe oferecer PAZ, PÃO e POVO EM LIBERDADE. Sejamos honestos: invadiram-no para defender o seu modo de vida, para defenderem os seus interesses.
Ah sim, dizes tu que, para nós, ocidentais, os seus interesses são os nossos interesses. Sim, sim. A nós também não nos interessa nada que os EUA assinem os acordos de Quioto. Nem que as tradições culturais, gastronómicas, sociais das Nações se vão perdendo na massa anónima e anódina de um caldo chocho fabricado por colarinhos brancos de empresas localizadas sabe-se lá onde, naturalmente aculturais. Francisco, lá voltamos nós ao nosso "Português Suave" e aos túbaros perdidos.
Voltando ao Iraque e aos EUA: lá por ser ocidental, social-democrata (vá lá, não faças esse sorriso irónico, eu disse "social-democrata", não disse PSD), gostar de montanhas-russas (é uma private joke, sim...), de Nova Iorque e da latitude que é permitida à liberdade de expressão pelas terras do tio Sam, de beber ocasionalmente uma Coca-Cola, não me vou põr a bater com a mão no peito, a rasgar as roupas e a gritar "traição" de cada vez que se aponta um dedo com razão às asneiras que os americanos fazem.
Que a esquerda "bête" critique cegamente tudo o que tem origem por lá, apenas porque sim, não é admiração por aí além, agora eu acreditava que ainda havia alguma direita reflexiva que falava só depois de alguma ponderação. O direitismo primário não é a melhor resposta ao esquerdismo primata, acho. Que pensas tu?
PS - Gosto do "twist" de NMP - "(...) já haviam passado 10 anos sobre o 25 de Abril, e ainda havia meia dúzia de lunáticos que punham bombas em Portugal (...)". Ainda. Ou seja, durante dez anos houve bombas em Portugal aos fim dos quais, ainda havia meia dúzia de lunáticos que as punham. (Vejam lá como são as coisas, a guerra acabou em 45 e trinta anos depois ainda havia meia dúzia de lunáticos que punha bombas na Alemanha e em Itália!)
E já agora: responder às acusações de imperialismo cultural americano com citações da "alta cultura" produzida por lá, é tão imbecil como defender o regime de Saddam com base no bom trabalho feito no Museu Nacional de Bagdad.
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