outubro 05, 2003

PIAZZOLLA

Nas nossas ruas, ao anoitecer,
Há tal soturnidade, há tal melancolia,
Que as sombras, o bulício, o Tejo, a maresia
Despertam um desejo absurdo de sofrer.


Na música de Piazzolla assenta este mesmo desejo de sofrimento, uma raiva desesperada, domada mas incontrolável de sentir. Para mim, é um grito de solidão, a falta de ar que se sente em locais muito vastos e muito ermos, muito cheios de vazio. Já sentiram este incongruente estado, onde a ausência do outro é insuportável, em simultâneo com a impossibilidade de se aceitar a sua presença?

Quando a oiço, sempre que a oiço, coexistem com ela imagens do rio, de portos cheios de abstractas máquinas paradas que em ferrugem se perdem. Ao longe, o marulhar de pequenas ondas de maré e o resto da cidade que não se vê. Perto, paredes de tijolo descarnadas, rugosas, mudas. Por certo é sempre Inverno e o vento e o frio são companhias. Porque será que todas são filmadas em 8mm, cheias de grão e já riscadas de tanto vistas?

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