dezembro 31, 2003

BALANÇO ÚNICO

Não me está a apetecer muito entrar na moda da listas, das retrospectivas, no entanto, aqui vai uma concessão à fruta da época.

2003 pode resumir-se numa pequena frase: 2003, ano nacional da incompetência.

Incompetência do Governo, ao não perceber que, na tentativa de redução do défice de qualquer forma, estaria a reduzir, por via da recessão, o montante dos impostos arrecadados, difcultando desta forma a cobertura das despesas correntes.

Incompetência no combate aos fogos florestais, incompetência na organização da prevenção dos próximos.

Incompetência política do PS.

Incompetência na organização das cunhas no ministério da educação.

Incompetência na organização do processo Casa Pia.

Incompetência, incompetência, incompetência.

De todos, para gerir o país, a nossa vida, o nosso futuro.

A ARCA DE COPENHAGA (II) - UNDER BYEN, KYST


Autêntico tiro no escuro. Como explicar a uma dinamarquesa, em inglês, o tipo de música que nos entusiasmaria ouvir? Tentei o óbvio - Bjork, techno, folk... Que mistura. Acho que o que procurava era uma espécie de madredeus versão dinamarquesa. A rapariga, depois de confirmar com uma colega, deu-me este. "Posso ouvir?", infelizmente não. Permaneceu mudo até Lisboa. E foi uma revelação. É muito, muito, muito bom.

Fica como a minha prenda de ano novo a todos os que passam por aqui.

A ARCA DE COPENHAGA (I) - MALENE MORTESEN, PARADISE


Jazz bem tocado, bem cantado.
Supera as Diana Krall deste mundo (daquele mundo).

CARL-HENNING PEDERSON

JARDINS SECRETOS

Há em Lisboa um jardim público tão secreto que nem a Câmara Municipal sabe dele. Situa-se no Lumiar que, como toda a gente sabe, é fora de portas, o que talvez explique o estado de abandono que vive. É enorme - o que também deve dificultar a tarefa de quem, em teoria pelo menos, deveria velar por ele.

Tem um longo relvado, cravejado das inúmeras chuteiras que o invadem ao fim-de-semana; um bosque, onde o barulho da urbe chega filtrado, onde se joga uma quase possível ficção de floresta;
um lago, com arredondados cantos, rodeado de edifícios semi-construídos e invadidos por caridosas heras.

Tem também prédios menores, prédios de subúrbio, que espreitam por cima dos muros. Tem reformados, claro. Sentados nas tristes mesas de reformados que a autoridade espalhou pelos jardins de Lisboa e - muitos -, à volta dessas mesas onde se jogam inevitáveis biscas.

E, coisa rara - coisa esquecida - tem um Botero escondido atrás de uma vedação, produto concerteza da troca comercial que possibilitou a exposição do Terreiro do Paço há uns anos. Desinteresse de João Soares ou mais uma marca do desprezo de Pedro Santana Lopes perante os actos de seu antecessor?

(Sugestão: dadas as afinidades de gosto com as opções teóricas provenientes do lado PCP da ex-coligação que PSL tem demonstrado nos últimos 2 anos, não haverá ninguém da EPUL que sugira a uma das tias da vereação que a escultura foi uma iniciativa do PC chumbada por JS e que merecia uma colocação em praça pública?)

A MIM A BRUMA, A MIM



He da! He da! He do!
Zu mir, du Gedüft!
Ihr Dünste, zu mir!

so spracht Donner

dezembro 30, 2003

OS DEUSES DEVEM ESTAR LOUCOS

A partir de Janeiro, na 2, às segundas, 10 da noite - Six Feet Under.

Ensandeceram.

dezembro 29, 2003

2005, JANEIRO

"Finalmente terminou o julgamento do caso "Casa Pia" com o anúncio das sentenças. Carlos Silvino, o único acusado que reconheceu a sua culpabilidade, colaborando com o Ministério Público em troca de redução da sentença, foi condenado à pena máxima, sem direito à concessão de liberdade condicional. Dos restantes arguidos, os que se encontravam em prisão preventiva desde o início das investigações, em Janeiro de 2002, foram condenados a três anos de prisão efectiva, coincidentemente o tempo já cumprido. Aos que evitaram a prisão preventiva foi ditada uma pena suspensa de dois anos. Termina assim o julgamento mais mediático de sempre em Portugal, tendo os responsáveis políticos e judiciais do país declarado sentirem-se plenamente satisfeitos com as conclusões do julgamento e confiantes de que "o monstro da pedofilia está definitivamente erradicado do nosso país com a prisão dos seus únicos mentores".
Dos jornais

REUMATISMO

Parece ter atacado o blogger. O Planeta mexe com dificuldade uma perna e depois outra. Completamente reumático.

CADERNO DE VIAGEM

COPENHAGA, INVERNO

DIA 1

O AEROPORTO

É perto da cidade, é novo, é enorme – muito mais do que seria de esperar num país com poucos habitantes e de alguma forma periférico em relação aos centros turísticos mais populares da Europa.


É de uma arquitectura que, à falta de adjectivo mais técnico, me apetece chamar “clean”, uma espécie de modernismo nórdico, de linhas muito sóbrias, muito bonitas, muito lineares, algo como a B&O aplicada aos edifícios.

Espanta-me, mais do que o silêncio, a ordeira calma do lugar: os monitores para auto check-in, as pessoas que vão partir e as que chegam, as filas para comprar o bilhete de comboio – tranquilas! -, a eficácia do inglês dos funcionários, as linhas de comboio que passam sob a gare, à distância de uma escada rolante.

Espanta-me ainda a inteligência da disposição das lojas: no caminho de quem chega e de que parte, muitas, cheias do que é dinamarquês – longe, muito longe do que se faz em Portugal.

STROGET


Anunciada como a rua pedestre mais longa da Europa, a Stroget (que é um nome comum a quatro ruas que se encadeiam) não apresenta muitas diferenças em relação à típica rua para consumo: uma excepção, os edredons magníficos da Ofelia, que vontade de comprar muitos e levar para casa.

A NOITE
... no Inverno, acontece de dia, nestas latitudes impróprias para consumo meridional. É estranho dizer “boa-noite” às quatro da tarde como ilógico seria dizer “boa-tarde” com esta escuridão. O Governo baixa o preço dos cigarros e das bebidas alcoólicas no Inverno. Para diminuir a depressão. (O que é mais uma medida demonstrativa da humanidade do poder por estas bandas).

DIA 2




Neblina e nada de neve. Frio, frio seco e diferente.

As ruas neste centro da cidade prolongam a calma sentida no aeroporto. Há passeios com pouca gente, esparsos carros, bicicletas, muitas bicicletas. Nesta luz fria, o vermelho das caixas de correio brilha como néon.



NYHAVN
Do pouco se faz muito. Uma frente de canal sem saída com todas as casas meticulosamente recuperadas, com um restaurante ou bar no piso térreo de cada uma, cores envolventes, a atracção que os portos sempre exercem no espírito nómada de todos os europeus ribeirinhos e eis mais um ponto de passagem necessária.





Nyhavn, new haven, novo porto.

DA TRANSPARÊNCIA DOS CANAIS
Impressiona-me a claridade das águas dos canais. “Cristalinas” é a caracterização óbvia. Parecem despejadas de milhares de garrafas de água mineral. Desporto pessoal: tentar descobrir o maior número de bicicletas nelas depositadas: 3 é o recorde. Estranha incongruência.

ROSENBORG
Não sei se é um castelo de fadas ou uma mansão de terror, a arquitectura sugere os dois. Renascença flamenga adaptada aos gostos de um rei dinamarquês do princípio do século XVII, adapta-se bem aos contos de Anderson, simultaneamente encantatórios e assustadores.


Na neblina de fim da manhã, na solidão dos jardins no Inverno, as suas torres assimétricas sugerem gritos emudecidos, respostas talvez às preces mudas das árvores descarnadas de folhas.

Belas árvores, nodosas, prenhas da vida que irromperá na Primavera.



O jardim das rosas morreu. Anuncia-o um pedido de desculpas dos responsáveis: um fungo destruiu os buxos, optando-se por tudo refazer. Por agora, é um espaço fechado por arbustos, um labirinto sem desafios, onde no pavimento se marca a memória dos talhões.

CARL-HENNING PEDERSON
O acaso brinda-me sempre com imprevistas emoções. No Statens Museum for Kunst, um exposição retrospectiva de Pederson – que não conhecia. Que deslumbramento! Integrante, nos anos 50, de uma das mais motivantes propostas da arte europeia do pós-guerra – o grupo COBRA -, Pederson construiu (e ainda constrói: continua activo nos seus noventa anos) uma aventura pictórica que me surpreendeu e cativou.


Ritmos, cores, emoções – sorrisos, gritos, enternecimentos, solidariedades -, e uma extrema beleza.

Às frequentes interrogações que tenho perante a arte contemporânea - esta obra, aquele artista : funcionam ,são fraudes? – respondem actos como os de Pederson. Sim, sei distinguir de alguma forma, em pequena escala, o trigo de algum joio. Sim, o que sinto é diferente. Sim, mesmo a arte contemporânea – a Arte, não o que me dizem que é arte -, sabe fazer-se escutar neste meio baralhado habitante de um planeta único.

DA CARNE COMO ALIMENTO DO ESPÍRITO



DIA 3

MALMO, SUÉCIA

É como se dissesse, “Estamos em Lisboa, vamos até Alcochete pela ponte Vasco da Gama”.

Dois coelhos de uma vez só. Com a ligação de Oresund, os dinamarqueses recriam a unidade da região existente no passado (Malmo foi dinamarquesa durante 300 anos) e captam novos visitantes, novo tráfego para o aeroporto (claramente é mais fácil aos suecos viajar via Copenhaga do que via Estocolmo) mais trocas comerciais. Clever boys, pequeninos mas muito bons no que fazem.

SIGHTSEEING


Aprouvera a cada cidade portuguesa um conjunto como o existente no antigo castelo que agrega um museu de história natural, um museu histórico e um museu de arte!


Dito isto, acrescento: não vale a pena o desvio. É bom para os que estão, forma as criancinhas, incute-lhes o gosto da descoberta, estimula-as a querer ver mais. E pronto.

Para os forasteiros, a diferença faz-se na praça central – Stortorget - com os seus exemplos de arquitectura renascentista holandesa (século XVI) e Lilla Torg – uma pequena praça próxima, com edifícios de estrutura de madeira à vista construídos entre os séculos XVI e XVIII. Infelizmente, o mercado que aqui existiu durante séculos foi afastado para espaços mais higiénicos. É nos mercados que me encontro com o espírito dos locais.

BICICLANDO

Cidades do Norte da Europa e geografias planas dão origem a este culto pela bicicleta que se traduz em quilómetros de vias próprias espraiadas por todo o lado e no requinte de semáforos exclusivos. Ora pudesse Lisboa ser mais aplanada e os seus responsáveis mais aplainados...

DIVERSÕES
Em dinamarquês, “Feira Popular” diz-se “Tivoli”. Apesar das referências encomiásticas que encontrei espalhadas por tudo quanto era guia, oficial ou comercial, achei-o uma versão nórdica do portuguesinho Passeio dos Tristes. Muita família, muita criança, muitas atracçõezinhas (fechadas a maioria, ainda por cima, por culpa do frio, do Inverno, da escuridão, whatever), muito dinheiro para pagar cada coisa.


Com o pragmatismo próprio do país, os parques americanos são muito mais eficazes: paga-se tudo à entrada e, lá dentro, quem quiser andar anda, quem não quiser, andasse. Por aqui, 9 euros para entrar, 3 euros para umas coisas, 6 euros para as mais obviamente desejadas.

Desejável para os habitantes dos trópicos europeus, talvez só o laguinho gelado, com hipótese de patinagem: por 10 euros, give or take, um par de patins e um muito maior número de bate-cus, durante uma hora.


DIA 4

MAIS BICICLANDO






Desculpem lá, mas qualidade de vida é isto: duas vias para bicicletas, uma para ir em frente, outra para virar à direita. Por causa das prolongadas filas...

INDÚSTRIA PESADA


Até as fábricas são poéticas nesta placidez azul de céu e canal. As chaminés e o fumo delas saído – juro -, pareciam apenas mais umas quantas verticais e horizontais de composição do quadro. Tipo os suiços a lavarem o chicote na orgia do Asterix na Helvecia. Aposto que estão vários dinamarqueses no interior da chaminé a lavar o fumo, para ele poder sair sem fazer mal às criancinhas.



Se não dá mesmo vontade de vir a correr montar uma Tate Modern Modern neste edifício.
Ainda por cima tem a biblioteca do outro lado.


MASTER ARCHITECTS, AN OPINION PLEASE!


Penso que o LAC, quando fala da arquitectura- espectáculo, se referirá a edifícios deste tipo. Eu também. Gosto dos interiores, gosto da ruptura com os tons da cidade, gosto da pureza quase radical dos volumes, gosto da tecnologia que lhe está associada (meu caro Pedro, aqui, arquitectos e engenheiros trabalharam de lapiseira dada).


E acho que a ligação com o edifício antigo também resulta muito bem. Esta frente de rio é tão bonita como a de Lisboa, com duas vantagens: menor largura, o que possibilita uma relação mais estreita entre as duas margens; uma água transparente; dinheiro, muito dinheiro. Já são três.



NEVE


Só vi esta.


DIA 5


Esta Glyptotek vale principalmente pela sua colecção escultórica, ainda algumas das obras francesas do século XIX mereçam, por si só, a deslocação.



O maravilhoso da vida neste cruzamento de ritmos. A extraordinária perfeição técnica, aliada à atenta observação do real.



Da escultura romana, a anos luz da sua antecessora grega, para além das inúmeras cópias que, se outro mérito não tivessem, seriam sempre importantes como referência do original perdido, retenho a perfeição destes rostos, a sua extraordinária humanidade. Imperadores ou cidadãos, deuses ou mortais, nestas máscaras reteve o artista toda a vida do seu tempo. A sua matriz existiu, sentiu, amou, sofreu, preocupou-se com eventos que soam a ninharias à nossa análise histórica mas que, concerteza, são tão importantes quanto as importantes ninharias que nos preocupam hoje.



Encantaram-me mais as possibilidades gráficas da escrita e dos registos egípcios do que confabulações teóricas mais ou menos acertadas.






Nasce-se escravo?, escreveu o escultor na base deste busto. Duplamente escravo, de pele negra e mulher. A obra é novecentista, mas a pergunta continua no presente.

dezembro 28, 2003

KUROSAWA

Uma das mais belas prendas que recebi do Pai Natal deste ano.

ESCÂNDALO

Então o Berlusconi continua em liberdade apesar de todos os processos e o patrão da Parmalat vai preso? E ainda dizem que o futebol em Itália é diferente do português...

LAGOA DE ÓBIDOS

Modo original de poluição encontrado pelo Instituto da Água: implantar cordões de protecção às dunas constituídos por sacos de plástico com uma tonelada de areia cada um que a cada inverno o mar se encarrega de destruir. Para onde vai o plástico que ninguém se entretém a recolher? Vai por aí.

AINDA BAM

Inevitável, a contemplação da fragilidade da vida, dos meios que julgamos seguros e que se transformam em instrumentos da nossa destruição, leva-me à reflexão sobre o Deus, o Destino, a Vida. Melhor, sobre a existência de Deus, do Destino, de objectivo na Vida.

No contínuo da História, estes ciclos de morte e vida são comuns e repetidos: a convivência dos egípcios com o Nilo, portador da vida (os campos férteis) e da morte (as cheias), dos italianos com os vulcões, a inssitência das populações em permanecer em regiões de frequentes ocorrências sísmicas. Trazem consigo um desejo de risco, de desafiar o óbvio risco? Desacreditam da inevitabilidade do destino ou aceitam a pena em troca da riqueza prévia?

Como crianças grandes, vivemos em cima do perigo fazendo por ignorar a sua existência. Não contentes com o risco, adicionamos mais uns quantos ao ritmo natural da Natureza, poluindo, obstruindo linhas de água, alterando a paisagem. Um risco idiota por evitável.

dezembro 27, 2003

IRÃO, BAM



Aconteceu no Irão, é lá longe, estas "coisas" acontecem "nesses" países, longe de nós. Damos a nossa solidariedade, compungidos com a dôr que vemos nas imagens.

Esquecemo-nos - ESQUECEMO-NOS DEMAIS - que a probabilidade do mundo assistir a imagens parecidas tiradas em Lisboa aumenta a cada dia que passa. Para além do barril de pólvora que os bairros históricos são - com os seus materiais de construção combustíveis, as toneladas de lixo acumulado ao longo de séculos, as instalações eléctricas deficientes, tudo altamente inflamável - Lisboa (e o resto do país) é um castelo de cartas à espera de um abanão para ruir e o centro histórico ruirá totalmente. Para os que acham que o Marquês e os seus engenheiros tudo previram, ofereço notícias de desengano: incúria, esquecimento, desleixo, destruiram em dois séculos a laboriosa teia resistente construída. E o Marquês não se ocupou nem de Alfama, nem da Mouraria, nem da Madragoa, nem do Bairro Alto, nem dass Avenidas Novas... Nem o Marquês, nem os que o seguiram.

dezembro 26, 2003

DEGAS

Acho que encontrei as dançarinas de Degas que a Cristina "Indiscreta" procurava. Na Glyptotek (que variação fonética divertida da "Glypotek" alemã!) de Copenhaga. Serão estas?

GUERRA CIVIL?

Não é, mas o modo como muitos se encarniçam nas estradas é equivalente. Não consigo encaixar principalmente os casos de circulação em sentido contrário nas auto-estradas e vias rápidas: suicídio? distracção? roleta russa? azelhice? O que explica circular metros e metros de asfalto ignorando os sinais dos que vêm na outra direcção? It puzzles me.

dezembro 25, 2003

TWO BRIGHT THINGS ABOUT LOVE





Façam os juízos que fizerem, sonhar é sempre uma maravilha, alienado ou não, enganado ou não, irreal ou não.

dezembro 24, 2003

VOLTEI E TUDO NA MESMA

Cinco dias em Copenhaga. Volto e o país continua a fornecer mais do mesmo. A Teresa de Souza faz uma análise que me parece ajustada, no Público de hoje.

"Era preciso apenas um pouco mais de organização, um pouco mais de respeito pelo próximo e um pouco mais de sentido de responsabilidade. São esses os recursos que verdadeiramente escasseiam neste país. " Vindo como venho de um país que, com menos população, menos área, tão periférico quanto e com um vizinho grande ao lado, apresenta uma diferença em relação a nós tão grande em termos de pib, qualidade de vida e outras coisinhas assim, estou tentado a concordar.

dezembro 18, 2003

TENHAM VERGONHA NA CARA

Mete-me NOJO a hipocrisia que escorre das tomadas de posição da direita em relação à interrupação voluntária da gravidez.

AND THE OSCAR GOES TO


(Tem de ir. Tem de ir. Tem de ir)

dezembro 16, 2003

EMPRENHAR PELOS OUVIDOS

Considerando que as minhas fontes estão correctas, uma das mais fantásticas discussões que tiveram lugar na história da Igreja Católica prendeu-se com o modo como teria a Virgem engravidado: não tendo havido uma relação "normal", como teria sido possível a Deus - ou ao arcanjo por Ele - engravidar Maria? Uma das teorias mais interessantes baseava-se na assunção de que a gravidez teria surgido pela palavra de Deus - logo Maria teria emprenhado pelos ouvidos. Se a teoria não pegou, já a expressão ficou, continuando a ser bastante usual hoje em dia.

Esta tábua de Simone Martini é, para mim, a representação perfeita desse modo de engravidar: repare-se na forma do corpo de Maria, retraindo-se e simultâneamente acolhendo o "esperma" divino que lhe chega sob forma de texto. Ao vivo, nos Uffizi, a composição é muitíssimo mais deslumbrante; um deslumbramento igual ao que terá perturbado a Virgem há 2000 anos atrás.

A MORTE, O QUE É?

Fabulosa interrogação nesta obra que encontrei nas caves do meu computador, sem indicação de proveniência ou autoria.

ALFAMA II


Em tempos, também à porta das muralhas das nossas cidades morriam os guetos. Em tempos, também em Portugal se perseguiam e matavam judeus. Em tempos, também os judeus contribuíam para o progresso deste país. Quando a Europa não parecia, às vezes, tão longe.

ALFAMA I


A reconstrução de Alfama no pós-terramoto fez-se maioritariamente com o reaproveitamento dos materiais encontrados nas ruí­nas dos edifí­cios tombados.
Esse é parte do seu encanto.
A reconstrução de Alfama no pós-terramoto fez-se maioritariamente com o reaproveitamento dos materiais encontrados nas ruí­nas dos edifí­cios tombados.
Essa é parte da sua ruí­na.

HEDONISTA SALTEADOR DE POSTS ALHEIOS

... é o que eu sou. Das minhas caminhadas diárias pela Janela Indiscreta retive esta obra de Bonnard e respectivo texto. Comecei por comentar. Depois, encantei-me e copiei tudo para aqui.
A pintura:

O texto:
"Pierre Bonnard | Praça Clichy 1947 | oil on canvas 138.0 (h) x 203.0 (w) cm
Musée des Beaux-Arts et d'Archéologie, Besançon, Gift of George and Adèle Besson 1963. Deposited by the Musée national d'art moderne

Place Clichy, on the western slope of Montmartre, is the centre of a number of radiating avenues, a busy place full of people shopping, talking and drinking coffee. The automobile and commercial businesses visible in the background demonstrate the prosperity of the times.

The view is from the terrace of the Brasserie Wepler. Its awning is visible along the top of the picture, with the words soupers (suppers) and brasseri[e] facing out to the street — and therefore seen by us in reverse. The horizontality of the awning is echoed in the frieze-like array of people across the bottom half of the canvas. A waiter stands at the extreme left, another at the right. Two women on the left walk by, while the two to the right, accompanied by a small child, appear to be about to seat themselves at a table. A man walks with a dog, and two girls cross the street arm in arm, one of them carrying a basket of laundry. Passengers look out of the passing car. Figures on the far right with a parasol shield themselves from the bright sunlight bathing the scene.

A sense of depth is conveyed by the diminishing size of the people from foreground into middle distance; by the nearer buildings overlapping more distant ones as in a stage set; and by the softening and blurring of the most distant details.

© National Gallery of Australia"

O meu comentário:
Eu acrescentaria que a composição é baseada (e estabilizada) nas inúmeras verticais existentes - as pessoas, os azuis e vermelhos dos anúncios, das janelas, das arestas dos edifícios. Não concordo com a "horizontalidade" das pessoas citada no texto (se traduzi bem). A única horizontal forte, para além do friso do toldo (?) é a do automóvel, a qual, aliada à côr "divergente" (amarelo) das dominantes da composição cria uma dinâmica que sustenta o caminhar do olhar da esquerda para a direita. Olhar que é travado na fuga para fora do quadro pelos vermelhos.
Os dois criados, pelo posicionamento e pela côr, juntamente com a, referida no texto, grafia invertida do toldo, criam uma espécie de limite cenográfico que traça a fronteira entre o espaço do observador (o pintor) e a realidade recriada.

dezembro 15, 2003

AO ENCONTRO DO PASSADO

O No Arame deixou-me mesmo pendurado... das minhas recordações.

Os Pequenos Vagabundos foram A série da minha infância, o meu arquétipo da Aventura, dos Amigos, do Companheirismo. Dei comigo a trautear o tema da série, a recordar a Marion, paixão antes do tempo... Malditas ficções que nos levam ao engano!

Através do Alexandre, descobri um maduro belga com uma pancada tão grande que se dedicou a construir um site, o qual, desde Agosto, já registou 12000 visitas. E ainda falam do Abrupto...

VAIDADE MINHA

Desculpe lá tio Marcelo, mas eu já tinha aventado por aqui (ok, de uma maneira elíptica) a hipótese Haia para o julgamento de Saddam (veja lá mais abaixo, escrito às 13:32), sete horas antes do jornal da TVI. Ando mesmo bruxo.

MUTISMO

O meu homónimo na Epiderme queixa-se que os comentários ficaram paralisados numa esquina da net durante uns tempos até aparecerem em cataduta, atrasados e desactualizados. Será que se passa o mesmo por aqui ou desististe mesmo de comentar?

dezembro 14, 2003

DO "CONFORTO" NOS CAMPOS DE FUTEBOL DO EURO

Que os jornalistas falem e escrevam sobre assuntos que não dominam, recorrendo a fontes supostamente credíveis, é um facto da vida - ninguém pode ser especialista de tudo e alguém terá de servir de veículo entre o objecto e o espectador, de preferência alguém que domine as técnicas da comunicação e tenha o descernimento suficiente para saber distinguir entre o que é verdadeiro e o que não é.

Assisto, hoje em dia, ao progressivo aniquilamento dessas duas qualidades: nem as jovens "fornadas" parecem saber escrever com um mínimo de qualidade nem o discernimento parece viver os seus melhores dias.

Que tenham citado até à exaustão a "qualidade" que os novos "estádios" proporcionariam aos assistentes, ainda vá lá; que tenham concluído que era essa qualidade que impedia um número elevado de assistentes, já me pareceu um bocado autista, mas pronto.

Agora que, depois deles prontos e visitáveis ainda continuem a falar dessa "qualidade" esquecendo as correntes de ar nas Antas, a chuva que continua a molhar em todos eles, o desconforto que, obviamente, continuará a existir, porque todos eles são ainda recintos ao ar livre, já é indicador da indolência mental que ataca muitos.

E quando vejo a continuada mediocridade de que enfermam a maior parte dos jogos de futebol do campeonato português, sem preocupação por parte dos envolvidos em fazer corresponder aos muitos euros dependidos num bilhete um divertimento equivalente, fico sem perceber porque é que ninguém refere que as cadeiras só se mantêm vazias porque parvos, há cada vez menos.

INEVITAVELMENTE SADDAM

Ele (ou alguém por ele) ali está, em bicrómico azul e negro, humilhadamente desgrenhado e de barba grisalha, os dentes analisados como a um cavalo. Como imagem da derrota, beatificamente coberta pelo manto humano das preocupações sanitaristas, não está mal.

Tenho de fazer um esforço de memória e associar a esta imagem de mendigo cuja prisão suscita gritos de alegria a alguns dos assistentes, os anos e anos de ditadura impiedosa, os relatos de detidos, torturados, foragidos, as negras imagens de mulheres e crianças curdas gaseadas, as guerras iniciadas.

Qual será o seu futuro? Nuremberga? Guantanamo? Haia? Sob que arco de triunfo desfilará agrilhoado?

dezembro 13, 2003

ESTACIONAMENTO PAGO EM LISBOA

Uma câmara que se entreteve a aprovar projectos de edifícios sem estacionamento próprio; que aceitou o pagamento de mais-valias como forma de branqueamento das ilegalidades cometidas pelos construtores; que fecha os olhos ao aproveitamento de caves de estacionamento para outros fins pelas grandes empresas - anuncia agora a intenção de cobrar o estacionamento aos moradores da cidade.

Para além de imoral é mais uma medida inteligente para afastar a população da cidade.

BISPO DO PORTO AO EXPRESSO

Ainda há católicos inteligentes neste país.

AMOR COM AMOR SE PAGA

Aos distraídos que se indignaram com o "perdão" de Portugal ao incumprimento do déficit da França de da Alemanha:

França apoia Lisboa para sede da Agência de Segurança Marítima

ENA, MAIS IMPOSTOS PARA COBRAR!

Com a venda das acções da Somague, o Banco Privado Português «obteve uma mais-valia de 30 milhões de euros a que corresponde uma taxa de de retorno anual da ordem dos 40%», afirmou o seu presidente, João Rendeiro., no Expresso.

Será que 30% destas mais-valias vão para o Estado via IRC?

dezembro 12, 2003

PROVIDENCE

Só por citar duas vezes num mesmo post este filme que não cessou de figurar na minha lista de filmes favoritos desde que o vi em sessão quase clandestina no Técnico nos idos de 80, o blogsobrekleist merece destaque (não só por isso mas também e muito também) aqui. O blog e o seu leitor/comentador LuísMSerpa que o puxou para a conversa.

BURACO NEGRO EM ÓLEO SOBRE TELA

É bom saber através destas pesquisas via Google que no Planeta se pratica uma prosa que alia a Astronomia à Pintura a Óleo.

PRAÇA DO AREEIRO

Agora que eu já me tinha habituado ao Monumento aos Mortos da Revolução Francesa que está na Praça do Areeiro com a sua mais que justa homenagem ao Decapitado Desconhecido, lá vem o maire da cidade anunciar a encomenda de um novo monumento.

Duas coisas:

Uma - Não percebo o argumento da "desconsideração ao autor da peça existente": ou se reconhece mérito artístico "áquilo" ou não se reconhece. Se se reconhece, não faz sentido tirá-lo de lá. Se não se reconhece, então, por extensão, também não se reconhece capacidade ao seu autor e, portanto, não faz sentido convidá-lo para nova experiência.

Outa - Convém explicitar bem o objecto da homenagem ao escultor. Não. Convém explicitar bem ao presidente da Câmara que o objecto da homenagem é o ex-primeiro ministro Francisco Sá-Carneiro e não o putativo candidato a presidente da República Pedro Santana Lopes.

POPULISTA? QUEM, EU?

Decididamente, ando com azar nas intervenções do presidente da CML que apanho na televisão: não sei se por perversos efeitos da montagem ou por arreliadoras avarias no som, as frases soam sempre sem nexo, sem lógica ou sem razão. Não sei porquê, fazem-me lembrar um comentário que ouvi na rádio Eclesia de Luanda - um jornalista comentava as palavras de um ministro dizendo que era preciso "analisá-las dentro do contexto etílico em que foram proferidas". Longe de mim empregar tal frase em relação às declarações ouvidas esta manhã - longe de mim, porque não as considero aplicáveis. Lembrei-me apenas que, já que estamos na época natalícia, época de festas de natal na empresa, ontem teria calhado a vez à TVI e talvez a mesma se tenha estendido um pouco demais e que, talvez, os seus efeitos se tenham estendido a uma montagem mais original das declarações.

É que, coisas como (cito livremente) "estamos a trabalhar para que o subsolo fique para os transportes privados e a superfície para os públicos" (fala-se de quê? - do metro, dos estacionamentos, de La Defense?) parecem-me um pouco surreais. E depois das paragongas publicitárias da proibição de circulação automóvel em Alfama - quando qualquer cego que por lá tenha passado sabe que em mais de 50% dos arruamentos do bairro não consegue circular um triciclo quanto mais um automóvel - vir agora com a ideia peregrina de impôr uma taxa de circulação automóvel na Baixa e no Chiado soa-me mais a prova de vida política do que a uma ideia estruturada e bem fundamentada. Se não, vejamos:

- Esta medida é para aplicar a todos os passantes ou só aos "estacionantes"? É que, para se ir para Santa Apolónia ou para o Cais Sodré se torna quase inevitável passar pela Baixa...
- Aplica-se igualmente aqueles que vão estacionar nos parques públicos, duplicando-se assim o imposto?
- Os moradores também vão ser taxados?

Sendo ainda afirmado que o dinheiro da taxa servirá para pagar as melhorias nos transportes públicos (não sabia que a Carris, o Metro e a Rádio Taxis de Lisboa eram pertença da CML) será que esse dinheiro será investido na compra de mais veículos, na decoração dos existentes com cores mais bonitas e estofos mais alegres, na aquisição de equipamento de som para prolongar aos transportes públicos o traumatismo musical inventado para a Baixa ou, seguramente a medida mais eficaz, na colocação de cartazes por todo o lado com a frase inscrita: "Já reparou que lhe cobrámos mais uma taxazita para a cidade continuar a malbaratar dinheiro?"?

DICIONÁRIO POLÍTICO-PARTIDÁRIO VI

Minerva - Deusa da Concórdia. Diz-se que basta evocar o seu nome para pôr de acordo os dois maiores partidos portugueses.