“Se adivinharem quanto eu pesava no fim da guerra, pago já uma cerveja”. Sorriso travesso, A. Alto, magro, desafia-nos. Quantos pesará agora – seco de carnes, mano velho, cabelo grisalho, sessenta e cinco, setenta - ? “Quarenta, quarenta e cinco...” – as hipóteses mais pessimistas.
“Vinte!”, sorriso vitorioso. Exagero ou não, fica como imagem da guerra fratricida que imperou na cidade em 92. “Tivemos de fugir para o mato. De dia, ficávamos em cima de uns paus de árvore, à noite descíamos e enfiávamo-nos num buraco. Comíamos o que aparecia. Vinte quilos!”
“Um dia apareceu um tropa que eu sabia que era do Governo pelo uniforme e apareci. Julgou que eu era da UNITA e levou-me ao chefe. Por sorte que o chefe tinha sido meu chefe na tropa e conhecia-me.” Sorriso. “Deram-me um saco de sal, farinha e quatro latas de chouriço. E não é que eu dei em comer o chouriço todo de uma vez?! Incharam-me os braços, o corpo todo. Não morri por sorte. Estive dois anos na mata sem doença e foi o chouriço que me ia matando depois...”
“Devia contar essas histórias todas num livro”, incito. “Ná... só fala em público que não viveu estas coisas. Quem viveu, cala” diz, para relembrar logo a seguir “Estive na casa de um homem que me deu de jantar e insistiu para que eu passasse lá a noite e eu não quis. Quando saí, veio à porta para se despedir. Tinha dado uns passos quando veio um morteiro e bum! Rebentou mesmo na porta... A mulher pegou na pistola dele e matou-se”.
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