fevereiro 01, 2004

O COZINHEIRO, O LADRÃO, A SUA MULHER E O AMANTE DELA

[Faço um intervalo para falar de futebol (ohhhhhhh!... (2º intervalo)). A rábula que promete dar que falar durante os próximos tempos gira à volta do suposto rasgão dado pelo suposto futuro ex-treinador do FCPorto ("presidente Pinto da Costa, deixe-me sair do Porto...") acrescido da suposta frase "o Rui Jorge devia era morrer em campo" com a anuência do suposto Papa João Nuno XXI Pinto da Costa. Os visados juram mover um processo-crime contra o delator. Faz-me lembrar a agressão do Paulinho Santos ao João Pinto: foi mentira descarada até a TVI desencantar umas imagens a demonstrar a evidência. Pode ser que, no Alvalade XXI, não existam câmaras escondidas]

ACESSIBILIDADES

Numa época em que é público o empenho da CML em garantir que os projectos particulares cumpram as regras no que respeita às acessibilidades de deficientes motores, o Metropolitano continua a inaugurar estações muito pouco acessíveis.

AS "DÁDIVAS" DA CML

Deixei passar um tempo em relação à publicação da notícia do Público (generosamente fornecida à LUSA por um bem intencionado acessor de imprensa) para tentar não reagir a quente.

À primeira vista, parece uma boa iniciativa - tão boa que o próprio Vasco Franco não encontrou argumentos suficientemente fortes para a rebater (bom, seria difícil: o senhor vererador sempre se mostrou melhor a fazer do que a reflectir). Mas... Esta é a mesma Câmara que coloca cartazes gigantescos (ver três posts abaixo) a anunciar a sua vitória sobre o imobilismo privado; a mesma Câmara que, legitimamente, se arroga o direito de tomar posse administrativa de um edifício em mau estado de conservação e realizar as obras que ele há muito tempo merece e que a lei obriga. Esta, enfim, é a Câmara que zurziu os proprietários privados pela incúria e desatenção dada aos seus edifícios, ao ponto de os mesmos ruirem por falta de conservação.

Ora, que mensagem é esta? Mais uma vez, façam o que eu digo, não façam o que eu faço? Com que seriedade se obrigam proprietários a efectuar obras após esta declaração de incapacidade de as realizar? E como prestar contas públicas do dinheiro gasto a reabilitar edifícios de terceiros, dinheiro que não é empregue a reabilitar edifícios próprios? Que incoerência é esta de um organismo público que se prontifica a realizar obras responsabilidade de privados e se recusa a realizar as suas?

Por outro lado, este incentivo é tudo menos gratuito: aos "jovens" é-lhe pedido que paguem projectos, fiscalização, empreitada; que garantam o risco do investimento; que paguem os juros; que assegurem a manutenção... E que, o mais tardar aos 65 anos (com um bocado de sorte, ao mesmo tempo que se reformam), passem a pagar renda, ou procurem outra habitação (pode ser que, entretanto, este programa se estenda à 3ª idade - título do Público de 2030: "O eterno presidente da AML vai propor um programa de relançamento da habitação nas cidades-dormitório: "idosos" vão poder reabilitar prédios de habitação social devolutos")

Finalmente, há uma questão técnica com "alguma" relevância. Se os edifícios municipais habitados se encontram, na sua maioria, em muito mau estado de conservação, os desocupados estarão ainda em pior estado. Se considerarmos (ver posts sobre reabilitação) que, do ponto de vista estrutural, os mesmos apresentavam deficiências de base no que respeita à segurança sísmica (deficiências agravadas pelo mau estado de conservação), das duas uma: ou a recuperação levada a cabo pelos novos locatários ignora o problema e os mesmos correm o risco de verem o seu investimento de 30 anos literalmente ruir, ou não o ignora e estaremos, na melhor das hipóteses, a considerar obras de reabilitação no valor de, pelo menos, 200 contos por metro quadrado o que é, convenhamos, um bocadinho demais para algo que não pode ser vendido...

Gato por lebre.

janeiro 31, 2004

CEMITÉRIOS

Quando me perguntem razões para a atracção por cemitérios costumo fazer um ar entendido e explicar que, a par da gastronomia, os cemitérios são os melhores indicadores das características de um povo. Até pode ser. Mas o que me fascina são os diversos modos que os povos encontraram para lidar com a morte.

Um Raul Lino metido a sarcófago é uma maneira muito portuguesa de prolongar o locus amoenus que se pretende alcançar ainda em vida. Não é fantástico? É absolutamente fabuloso.

janeiro 30, 2004

AV ROMA

Pela avenida de Roma se espalharam muitos prédios de rendimento versão finais dos anos 50/princípios dos 60: caixotes sem varandas, a que só as boas áreas e acabamentos e a capacidade económica dos seus habitantes deu a aparência de qualidade que faltava à arquitectura. Uma espécie de plain portuguese architecture esticada até bem dentro do século vinte.

Houve, no entanto, excepções: no cruzamento com a avenida dos EUA, depois de uma das quatro torres gloriosas, existe este edifício. Jogo de volumes que resolvem a intersecção dos planos das duas massas diferentes que os ladeiam, varandas desafogadas abertas para os dois lados e que permitem um continuum entre os mesmos para os moradores. Um edifício que tem coisas a oferecer, estímulos, descobertas a fazer por quem nele demorar o olhar e com ele aprender a ver.

Não é preciso a arquitectura ser espectáculo para ser reparada. Basta pensá-la um bocadinho.

PRIORIDADES COERCIVAS



Muito gostava eu de saber quais os critérios de escolha de prioridade de prédios a serem intervencionados coercivamente pela CML. É que, apesar do opróbrio da posse administrativa, da intromissão de terceiros em propriedade própria, da perca temporária de controlo sobre uma coisa sua, a taxa de pelo menos 20% a título de multa e de encargos decorrentes de gestão da obra, é muito vantajoso ter a CML a coercivamente recuperar um edifício. Veja-se porquê:

- Não dá trabalho. São técnicos da CML que organizam e fiscalizam a empreitada (e os projectos, se existirem) o que garante, à partida, para os não-iniciados que são a maioria dos proprietários, um interlocutor mais capacitado para lidar com o empreiteiro;

- Tem garantia de satisfação. É muito mais fácil protestar com a CML do que com um empreiteiro que desaparece no fim da obra ou faz de surdo perante as queixas de trabalhos mal-executados. E é mais fácil porque o proprietário tem a faca e o queijo na mão: não paga a conta enquanto tudo não estiver perfeito. (Foi a CML que pagou: ela que se entenda com o construtor).

- Paga-se a la longue, de acordo com o valor das rendas.

- Não se paga tudo. A CML, no seu afã de melhoramentos, promove obras de beneficiação que não se enquadram no âmbito de obras de conservação, as únicas a poderem ser invocadas nos actos coercivos. Com um bom aconselhamento técnico, o proprietário consegue obter benefícios sem pagar mais por isso. (É claro que estes benefícios são feitos em nome dos arrendatários, mas de quem é a propriedade?).

- Não se pagam realojamentos nem se aturam inquilinos. Isso cabe a quem tomou posse administrativamente.

- Não se pagam os juros da banca.

Enfim, só tranquilidades. Portanto: será que alguém me explica quais são os critérios que definem as prioridades?

janeiro 29, 2004

O CÉU QUE RECUSA WENDERS

Retribuo o epíteto sem obrigação. Eu admirador me confesso: O Céu Sobre Lisboa tornou-se companhia diária. E mais não digo, para não cair no capelismo que tanto me enerva. Registo.

Porque é que são os blogs com menos audiência que mais me cativam? Falta de tempo de crescimento, falta de discernimento das massas ou completa dessincronização com o gosto popular?

A PROPÓSITO DE EMPREITADAS E PROJECTOS

Ouvi dizer que a CML acaba de lançar uma empreitada sem ter adjudicado o projecto que lhe deu origem. Convenhamos que é uma variação à empreitada lançada sem projecto aprovado.

DÚVIDA METÓDICA

Ex.mo Senhor Primeiro-Ministro,

Venho por esta informá-lo que, dado o estado periclitante das minhas finanças, tenho profundas dúvidas acerca da validade da retenção dos meus descontos para a Segurança Social. Deste modo, combinei com a minha mulher entregar a investigação do caso a uma autoridade independente - o meu contabilista - para verificar essa validade. Não se assuste, porque não há crime fiscal - o dinheiro vai continuar na minha conta a prazo, pelo que não o passarei a terceiros nem o aplicarei noutras coisas. Entretanto e uma vez que não faço o pagamento pelo legítimo direito que tenho de ter dúvidas, espero que compreenda que não faço intenção - mesmo que, ao contrário do suponho, seja legítimo o pagamento - de pagar juros de mora. Tivesse-me tirado as dúvidas antes de me apresentar a conta.

Respeitosamente,

A REABILITAÇÃO URBANA E LISBOA (V) - PROPOSTAS

Tendo historiado o percurso da reabilitação urbana na capital e identificado alguns dos seus problemas e ineficácias, parece-me - oportuno, indispensável, obrigatório - apresentar algumas soluções. Melhor, deixar o meu contributo para que, pelo menos por aqui, se deixe de só se apontar defeitos sem indicar caminhos.

Caracteristicamente, os chamados "Bairros Históricos" (classificação discutível - onde acaba a História e começa o Presente?), estão implantados nas colinas da cidade, perto do rio, em zonas com ocupação urbana com, pelo menos, 500 anos (Alfama e Mouraria muito mais: ocupação romana no primeiro caso, cerca de 850 anos a segunda). Zonas eminentemente de ocupação popular, a sua arquitectura e qualidade de construção refletem a menoridade económica dos seus ocupantes, especialmente as urbanizações instaladas na e à volta da colina do Castelo e que, genericamente, se poderão designar como Alfama e Mouraria. É sobre estes dois polos que me aprofundarei.

Se os tipos construtivos de arquitectura civil utilizados na zona (com excepção dos palácios existentes) eram, à data do sismo de 1755, de fragilidade clara (demonstrada pela destruição generalizada que o mesmo implicou), a falta de mão-de-obra especializada, desviada para a reconstrução da Baixa e dos edifícios nobres, levou à edificação de edifícios com materiais heterogéneos, técnicas abastardadas e sistemas estruturais que só na aparência estariam preparados para um melhor comportamento face a novos abalos. E se o passar dos tempos e das gerações levou a um progressivo esquecimento dos desvastadores efeitos de 1755 com o consequente afrouxar do rigoroso esquema estrutural pombalino nos novos edifícios construídos por toda a cidade, em Alfama e na Mouraria se esse "esquecimento" existiu desde o início, mais se veio a agravar no tempo. O que vê quem passa hoje pelas suas ruas é um conjunto de edifícios com claras patologias construtivas e estruturais (são visíveis os desnivelamentos de cantarias, as fissuras de esforço). E o que não se vê é tanto ou mais preocupante: suportes de pavimentos com as entregas apodrecidas pelas infiltrações de água, peças estruturais internas corroídas pela humidade ou pelo caruncho, escadas desniveladas indicando assentamentos das suas fundações.

Como inverter o processo? Contra o que poderia parecer lógico - identificar o que deve ser salvo e trabalhar a partir dessa definição-, defendo que, principalmente por esta operação ser, pelo menos no início, uma iniciativa do Estado e da autarquia, se devem quantificar de uma forma o mais exacta possível os custos da intervenção. Um dos maiores óbices à prossecução dos planos de reabilitação nos diversos bairros foi a falta de verbas necessárias: normal, quando o discurso oficial utilizava valores de reconstrução por m2 de, no máximo 120 contos e os orçamentos de projectos indicavam 160/180 (em obra, com as surpresas encontradas, a tendência foi o aumento destes valores). Se a construção tabelada para habitação social da mesma época era de, por m2, 70 contos, vemos bem a escala a que se trabalha. Acrescem aos custos de construção os de consolidação do substrato. Não existe cartografia detalhada do subsolo das colinas de Lisboa. Se se pensar que, por exemplo em Alfama, existem dezenas de minas referenciadas em escritos do passado das quais se encontram visitáveis ou acessíveis apenas algumas, se se pensar que, não há muitos anos, se "encontrou" uma cratera com mais de seis metros de diâmetro sob uma das ruas (e parte de um edifício), ver-se-à que, construir ou reconstruir com eficácia em cima de uma base periclitante é tudo menos possível...

Resumindo: constatar todas as variáveis de intervenção e orçamentá-las o mais exactamente possível, de preferência com recurso a uma equipa onde tenham assento técnicos de projecto das várias especialidades, técnicos de empresas de construção, medidores/orçamentistas (e faz tanta falta uma especialidade em Portugal equivalente aos quantity surveyers ingleses!). Depois, com base nestes valores, virá a definição pelo poder, da quantia disponível, ou melhor, da quantia que o poder político se permite dispender. E só então, finalmente, com base nos relatórios de arquitectos, historiadores, historiadores da arte, sociólogos, se decidirá onde intervir.

janeiro 28, 2004

GASTROMANIA



João Rieff. No meio do Oceano, longe dos holofotes lisboetas, que prazer encontrar uma cozinha de autor! Festa para os sentidos, a obra do mestre é uma agradabilíssima surpresa para quem vem às ilhas esperando apenas encontrar uma gastronomia regional honesta mas pouco inovadora. Combinando os elementos disponíveis, a tradição e o seu próprio sentimento, mestre Rieff coloca o seu restaurante no roteiro obrigatório de quem passa e de quem está.
Restaurante A Colmeia, Travessa do Colégio s/n, Ponta Delgada, S. Miguel, Açores

ADDENDUM URBANÍSTICO

"1 - Cidade é a expressão palpável da humana necessidade de contacto, comunicação, organização e troca, numa determinada circunstância físico-social e num contexto histórico.
2 - Urbanizar consiste em levar um pouco da cidade para o campo e trazer um pouco do campo para dentro da cidade.
3 - Nas tarefas do engenheiro, o homem é principalmente considerado como ser colectivo, como "número", prevalecendo o critério de quantidade; ao passo que nas tarefas do arquitecto o homem é encarado, antes de mais nada, como ser individual, como "pessoa", predominando então o critério de qualidade.
Por outro lado, os interesses do homem como indivíduo nem sempre coincidem com os interesses desse mesmo homem como ser colectivo; cabe então ao urbanista procurar resolver, na medida do possível, esta contradição fundamental."

Lúcio Costa, Arquitectura, José Olympio Editora, Rio de Janeiro, 2002

janeiro 27, 2004

ARTE, CENSURA E POLÍTICA

Interessante e fundamental a discussão que se estabeleceu na Suécia à volta da exposição de uma peça considerada polémica pelos israelitas e sem intenções panfletárias (ou pelo menos encomiásticas) do seu autor (ver história aqui).

Os suecos, irrepreensíveis na sua posição de separação de poderes, liberdade de expressão e responsabilização das instituições, mantêm, calmos, a sua posição perante a gritaria totalitária israelita.

Ora, neste caso fundamental não é a questão: até que ponto deve permitir-se a liberdade de expressão a quem defende o genocídio. Aqui, o que se discute é quem decide as intenções de um artista: ele próprio ou os seus espectadores? Nesta posição histérica israelita (repito - o artista nega publicamente intenções encomiásticas; a obra chama-se "Branca de Neve e a Loucura da verdade") (como em muitas outras) não está o germe de pensamento totalitário do seus antigos assassinos? Estou a lembrar-me da exposição de "arte degenerada", da queima de livros... Não me respondam com os seis milhões de mortos. Estou a falar de princípios não estou a falar de fins. (E não me chamem nomes: a barbárie nazi é uma enormidade sem perdão. E começou com a lenta tomada dos princípios, das ideias, dos valores, pelos nacionais-socialistas).

E CAIEM PRÉDIOS

No Cairo, um edifício cai. Era clandestino, tinha mais quatro andares acrescentados sem autorização municipal, as fundações estavam a ser alteradas para (provavelmente) aumentar o espaço da loja situada no andar térreo. No Cairo. Que fique bem claro que estas coisas só se passam em países subdesenvolvidos, onde o estado é fraco e as sentenças dos tribunais ineficientes. Em Portugal? Portugal é um país europeu, membro da União Europeia, Estado de direito...

The building was constructed in 1981, and police said the owner illegally added four more floors 12 years ago. An order from the city to tear down the extra floors two years ago was never executed. Six days ago, tenants complained to police, saying renovation in the appliance store could damage the building's foundations.

AMOREIRAS TWIST

AMOREIRAS


Se a câmara apanhar o lado certo, o lado fotogénico, Lisboa aparece bem, dá-se ares cosmopolitas, perde a sua inata escala de sardinheira e telhazinha canudo e até parece capital de uma contemporânea arquitectura.

Aparências, aparências...

SISMOS - ANTES (I)



Nas idas à Gulbenkian é favor utilizar o passeio certo.

LOGOS

Dez minutos numa fila a olhar para as traseiras de um autocarro dá nestas fixações. O design é interessante, mas não é um pouco trolorilorá? Numa austera, imponente, centro-do-poder autarquia?


janeiro 26, 2004

CÓPIA DESCARADA

... que faço para comentar um espaço óptimo (descoberto através do céu de lisboa):



(em vez de perder tempo a comentar divas de aviário bem que se poderia perorar mais acerca de actos tão bons como os constantes neste blog!)