outubro 18, 2003

DESABAFOS TELEFÓNICOS

Pelo que tenho lido, por aqui e por ali, uma frase de Ferro Rodrigues está a desfazer mais o PS do que tudo o que se passou desde que António Guterres renunciou ao paí­s. Ora, na sequência das discusões sobre a fronteira entre o que é público e privado, entre o que é publicável e o que deve morrer nas bocas de redacção, da vida das nossas figuras públicas, parece-me óbvio que o já célebre desabafo escatológico do secretário-geral que só aconteceu em privado - não é uma declaração pública, nem sequer foi pronunciado num jantar de companheiros polí­ticos mais ou menos dados à facultação de cachas a amigos jornalistas - não tem que ser divulgada. E se foi dita num contexto extremamente privado (quase em segredo: foi de boca a orelha), não tinha necessariamente de ser politicamente correcta; nem sequer tinha de ser generalista - terá provavelmente ocorrido como resposta a uma eventual preocupação do interlocutor face a um aspecto do caso especí­fico que estavam a discutir. Quantos de nós não terão já dito, "estou-me a borrifar para os impostos", "quero lá saber do meu pai", "quero que a moral se lixe" (isto com maior ou menor grau de calão utilizado) sem que isso possa ser considerado uma declaração formal e generalista sobre a nossa posição na vida em relação ao Estado, à  Famí­lia ou à  Igreja? (E os espanhois não dizem "me cago en la puta madre que me parió"?)

É por isso que não vejo nesta frase O ESCÂNDALO. Mas que me dá gozo ver o incómodo da Esquerda virgem, aquela entidade pura e sumamente í­ntegra, respeitadora das instituições, perante coisas como esta, lá isso dá...

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